13 out
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Steve Jobs: A Separação entre a Arte e o Artista – iPL semanal número 28

Não há dúvidas de que o CEO da Apple terá sido um dos líderes mais criativos, visionários e de alto impacto de sua geração – ou de qualquer outra. No entanto, embora muitos autores escrevam sobre Jobs buscando características extraordinárias de sua personalidade, a teoria de Liderança do Great Man – que tenta explicar a História a partir do impacto dos chamados “Grandes Homens” – foi abandonada há 40 anos. Diversas pesquisas empíricas sobre liderança mostram que não há traços que diferenciem a personalidade de líderes efetivos, e sim o que eles fazem. “Há uma confusão entre a ‘arte’ e o ‘artista’ e é fundamental entender como isso acontece”, afirma o CEO do iPL, Carlos Da Costa.

Liderança é ação, e nunca carisma, de acordo com Da Costa. Liderança está relacionada à construção de objetivos comuns e à capacidade de levar a equipe a alcançá-los. Nisso, muitos líderes carismáticos falham. “Devemos manter o foco no que Steve Jobs fez, sem dedicar tanta atenção para os mitos que foram criados sobre ele”, confirmou. “Há teorias muito respeitadas na literatura acadêmica sobre liderança, em especial na área de sociologia, que defendem que os líderes podem ser menos relevantes que os mitos que a organização consegue criar sobre eles.”

Então, o que Steve Jobs fez? Ele era uma mistura de dois estilos de liderança: “Visionário” com “Pacesetter”, com suas vantagens e desvantagens, segundo Da Costa. Tais estilos foram identificados pelos especialistas Richard Boyaltzis e Anne McKee no livro Resonant Leadership. Eles também analisaram outros perfis: Coaching, Afiliativo, Democrático e Comandante.

No caso de Jobs, o líder Pacesetter leva objetivos desafiadores à sua equipe, esperando excelência e se colocando como exemplo para os liderados (Faça como eu faço!). Se necessário, esses líderes arregaçam as próprias mangas para ajudar a salvar um projeto. O estilo funciona bem se o time for altamente motivado e competente. Ao mesmo tempo,pode ter impacto negativo no clima da organização, pois o líder se torna impaciente e dissonante quando as pessoas não atingem seu nível de excelência (que é tão alto quanto sua extrema competência).

Os líderes de estilo Visionário movem as pessoas com a construção de uma visão e ajudam o time a compartilhar um único sonho. É o modelo clássico da liderança e cria um impacto muito positivo no clima emocional da organização. Neste caso, o fato de o líder não mostrar a maneira exata de se chegar lá, deixa as pessoas livres para inovar, experimentar e tomar riscos calculados. “Para ser efetivo usando esse estilo, é preciso desenvolver senso de empatia. Não há como inspirar pessoas sem entender suas perspectivas, esperanças e sonhos”,  afirmou Da Costa.

No papel de líder, Jobs cercou-se dos melhores designers, engenheiros e fornecedores do mercado. Ele acreditava que os performadores mais talentosos não eram motivados por status ou dinheiro, mas por trabalhar em projetos excitantes. Ótimas pessoas querem sentir que causam alto impacto, que fazem parte de algo maior que elas mesmas. Usando as palavras de Jobs, elas querem se sentir “insanely great”. “Jobs era tão seletivo com as pessoas que ele deixava entrar na Apple quanto com as características dos produtos que lançava”, afirmou Da Costa. “O legado e a presença pessoal de Steve fizeram dele um recrutador incomparável. Aliás, seu principal legado pode ser uma geração de líderes que pensam maior e mais alto por conta de tudo o que Jobs alcançou.”

A seleção rigorosa do perfil de profissionais que integrariam a Apple ajudou Jobs a criar uma espécie de devoção ferrenha  do time em torno da ideologia central da empresa, ou “cult-like culture”, como chamou James Collins no livro “Feitas para Durar”. Para Collins, nem sempre as empresas visionárias são ótimos locais de trabalho. Na maioria das vezes, somente o são para as pessoas totalmente dedicadas às suas filosofias. Essas ideologias são transformadas, pelas empresas visionárias, em mecanismos concretos que as reforçam, como programas permanentes de treinamento, difusão de “feitos heróicos”, exemplos corporativos, linguagem e terminologias únicas. “No entanto, ao mesmo tempo que os líderes instauram essas culturas de devoção, eles devem se lembrar de preservar o núcleo, estimular o progresso, incentivando o espírito de mudança, a criatividade, a autonomia operacional e a descentralização”, disse Carlos Da Costa.

Foi o que Steve fez. O CEO da Apple uniu essa adoração  à solução do “Dilema do Inovador”, introduzindo na cultura da Apple um senso de rebeldia típico de empresas pequenas. “A grande maioria das empresas que crescem muito perdem a capacidade de arriscar”, disse Da Costa. “Jobs, não. Isso o fez ser tão diferente”. Da Costa citou o especialista Clayton Christensen, autor da teoria do Dilema. Para Christensen, empresas falham porque elas não conseguem se libertar das tecnologias que a levaram à liderança de mercado. Como resultado, a inovação não acontece, ou se torna mais lenta.

Um exemplo é a Microsoft, que continua presa a produtos como o sistema Windows e o pacote de softwares Office, criados nos anos 1970 e 1990 – ainda que seja a maior empresa de software do mundo, tenha um exército de programadores e invista centenas de milhões de dólares em tecnologia. No caso de Jobs, um exemplo ilustra seu estilo: quando o iPad estava pronto para ser lançado, as pesquisas indicavam que o tablet seria um fracasso de vendas. As pessoas não viam utilidade naquele produto. O CEO, porém, seguiu com o lançamento da inovação, que acabou revolucionando o mercado. “Nenhum outro executivo tomaria uma decisão dessas”, afirmou Da Costa.

A Apple foi resultado dessa ousadia calculada, do que Steve e sua equipe conseguiram fazer, e não apenas de quem Jobs era. Endeusar Steve Jobs é a antítese dele mesmo. Para a Apple continuar sendo vitoriosa, ela deve se rebelar contra a adoração que se tem por ele. Como Jobs mesmo faria. Ou cairá na mesmice e será vítima do Dilema do Inovador, como qualquer outra empresa comum poderia ser.

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